Os militares e o truco do golpe, por Sérgio Batalha


A nebulosa matéria do Estadão sobre a suposta ameaça do general Braga Netto ao Presidente da Câmara suscitou mais uma vez o debate sobre a possibilidade de um golpe militar no Brasil.


O general teria enviado um emissário ao Presidente da Câmara com a ameaça de que se não fosse aprovado o voto impresso, não haveria eleições no ano que vem. Os dois personagens da matéria negaram publicamente seu conteúdo, sendo que o general afirmou que o debate sobre o voto impresso seria “legítimo”, mas competiria à Câmara.


Sinceramente, este debate sobre um possível golpe militar já está se tornando cansativo e até ridículo. Os militares hoje não tem um projeto para o país, muito menos apoio popular para um golpe. Não tem apoio na mídia, entre os empresários, muito menos o apoio dos EUA. Em resumo, não tem as condições objetivas que propiciaram o golpe militar de 1964.


Na verdade, não tem nem mesmo uma coesão interna sobre este projeto de golpe. O general Mourão, um militar mais influente do que Braga Netto, afastou a possibilidade de golpe, acrescentando que o Brasil não seria “uma república de bananas”, uma alusão aos frequentes golpes militares em repúblicas centro-americanas.


O que há de sério nesta história é a tentativa de intimidar a sociedade por parte de uma ala militar ligada a Bolsonaro. Braga Netto é notoriamente o mais bolsonarista dos militares e procura utilizar o fantasma do golpe para obter o que não consegue pela política.


O próprio Bolsonaro aposta todo o tempo contra as instituições, sugerindo golpes e viradas de mesa. Na verdade, embora o golpe sempre estivesse em seus planos, hoje ele serve mais como um espantalho para assustar os políticos, um sintoma de desespero.


Atualmente o golpe militar é um blefe como os utilizados pelos jogadores de truco, com direito a gritos e tapas na mesa. Os generais do Alto-comando sabem muito bem o que representaria um golpe militar clássico, com tropas na rua e massacre de civis. Sabem que hoje ele lançaria o país no caos e em um absoluto isolamento internacional, talvez até provocasse um boicote comercial contra o país.


O objetivo deles com a intimidação recorrente é tentar tirar Lula do páreo, com a ameaça de que os militares “não aceitariam” a sua vitória. Assim, a vitória de Bolsonaro seria garantida a partir de uma campanha ainda mais truncada do que a de 2018.


A tarefa atual de todos os democratas é rechaçar firmemente a possibilidade do golpe e as ameaças vazias de Bolsonaro e seus asseclas. Se eles querem trucar, vão ter de mostrar as cartas. Uma democracia não se constrói sob a tutela de militares, muito menos ainda daqueles que apoiam o fascismo de Bolsonaro.


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Sérgio Batalha é advogado, professor universitário, especialista em relações de trabalho, além de conselheiro e presidente da Comissão da Justiça do Trabalho da OAB-RJ.

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