Fragmentos de Um Discurso Militar: Conservadorismo no Passado e Neoliberalismo no Presente, por Marcelo Barbosa

Ao Coronel Juarez Motta, democrata e patriota (in memoriam)


Para quem pretende informar-se sobre os sentidos da ideologia dos corpos militares, na atualidade e no passado, existe uma boa oferta de livros dedicados ao assunto. Textos redigidos, em sua maioria, por especialistas ligados à academia universitária. Consultando esse material, de grande relevância, surgiu em mim a curiosidade de tratar do tema por um ângulo algo distinto das abordagens mais frequentes nesses escritos acerca das relações entre elementos fardados e suas formas de consciência ideológica. Assim, no lugar de reproduzir as análises dos estudiosos do ideário dos quadros da FFAA, preferi indagar o que os próprios militares, por meio de variadas fontes, afirmam sobre si mesmos. Uma pletora de mitos, afirmações duvidosas, omissões e anacronismos intencionais, ou não.


Essa “voz” oficial, de grande repercussão nos eventos político-sociais do país, desde o século XIX, pode ser encontrada nos mais variados acervos. Pode estar numa missiva, num exercício de memorialismo ou ainda num tuíte do General Comandante da Força Terrestre, entre muitos outros expedientes discursivos. Para além da capacidade desses textos revelarem os contornos da realidade social ou – ao contrário – a falsearem, releva a capacidade de transparecer os elementos presentes em sua gênese. Tais documentos dão conta de uma recorrência ao longo do tempo. Trata-se da hegemonia das correntes do pensamento conservador no interior de uma corporação que, desde sempre, também conviveu com a presença de elementos radicais de extrema-direita, de liberais e mesmo de progressistas (até 1964).


O conhecimento da conformação geral dessa ideologia, seus limites e metamorfose, em tempos recentes, demanda atenção redobrada por parte dos observadores políticos.


No Princípio, era o território


Aqueles que trafegam pela rodovia federal BR- 232, em Pernambuco, à altura do município de Jaboatão, podem avistar uma placa em frente ao um quartel do Exército: “Aqui nasceu o Brasil”. A inscrição faz referência direta à Batalha dos Guararapes, ocorrida em 1648, evento no qual uma coalizão social ampla, hegemonizada por proprietários rurais, de origem portuguesa, infligiu a derrota militar responsável pelo colapso da ocupação holandesa no Nordeste do país.


Face à leitura do dístico, na beira da estrada, é possível perceber a intenção das autoridades militares em associar o combate, ocorrido no século XVII, à formação de uma consciência nacional e suas repercussões. Uma atitude de intencional anacronismo? Por certo que sim, já que existe nesta operação simbólica a deliberação de projetar sobre um passado remoto valores que só ganhariam nitidez no período imediatamente anterior ao processo de independência política, em 1822. Noutras palavras, em 1648, não havia “Brasil” e nem “brasileiros”. Tampouco existia, no cotidiano da luta contra a ocupação territorial da Companhia das Índias Ocidentais, o cancelamento das distinções hierárquicas entre caboclos indígenas, negros escravizados e a elite de origem portuguesa envolvidos na guerra, elementos que dificilmente sentiriam – se “irmanados” como evoca o notável samba de enredo composto em 1972.


É mito, sem dúvida. Sendo igualmente mitológica a origem dos exércitos nacionais dos países desenvolvidos supostamente surgidos do fragor cívico das revoluções burguesas na Europa, em especial na França e da Guerra de Independência nos EUA.   


A anatomia dos mitos sempre oferece uma boa prévia dos dispositivos de manipulação de imaginário utilizados pelas elites. Inclusive em seus pontos de fragilidade. E, o episódio de Guararapes não foge a tal padrão. De alguma maneira, o curso dos acontecimentos das chamadas Guerras Holandesas, quatro séculos atrás, já comporta variadas interpretações quanto à gênese de um sentimento “nacional”. Historiadores como Oliveira Lima deram seu imprimatur a esse tipo fabulação, por muito tempo hegemônica nos textos escolares:     


(…)O levante propagou-se com a rapidez do incêndio em campo coberto de tulhas de palha. A miséria em perspectiva, o rancor suscitado pelas ofensas recebidas, o ardor religioso redobrado pelas perseguições, uma pátria restituída, eram outros tantos motivos que favoreciam a revolta, que foi a primeira afirmação certa e irrecusável da unidade, eu poderia quase dizer, na nacionalidade brasileira.”


Acima, a partir da ótica do ensaísta e diplomata pernambucano, o Brasil surge da indissociação entre os interesses da nossa Periferia e a Metrópole sediada em Lisboa, conformando uma nação extraída da costela do seu colonizador. Essa última, inconfundivelmente ibérica e católica. Para conferir solidez a seu argumento, Oliveira Lima alude ao desempenho dos agrupamentos de tropas de linha e voluntariados diversos (de fato, compostos por negros, indígenas e brancos), contingentes rivais em bravura, devidamente condecorados pelas autoridades ultramarinas, ao fim das hostilidades. Reconstituídos dessa maneira, os fatos se amoldariam à narrativa – igualmente apoiada por Varnhagen – que atribui a origem dos corpos militares brasileiros ao processo de defesa do Território Nordestino em face do domínio Holandês. Assim, sob ampla cobertura da historiografia militar oficial, se veriam lançadas as sementes do simbolismo a acompanhar as origens do futuro Exército Brasileiro, instituição garantidora da unidade nacional, “braço armado do povo.”


À esta altura, não se pretende postular aqui – após o reconhecimento da funcionalidade do marco de Guararapes – um perfeito alinhamento entre classe social, ideologia e discurso. Até porque, na prática, nem todas as frações dominantes reivindicam para si este tipo de mito de origem. Antes pelo contrário. Basta uma conversa descontraída com indivíduos pertencentes à elite financeira, em regra seduzidos pela ilusão globalitária, para ouvir opiniões tais como: “o Brasil andaria melhor caso tivesse sido colonizado pelos holandeses”. Para esses paladinos do liberalismo, faltou ao país uma transfusão de sangue empreendedor em nossas veias e artérias entupidas de patrimonialismo lusitano. É falácia? Sim. Porém de grande difusão entre determinados estratos da população. Uma sensibilidade pouco atenta aos desdobramentos da obra civilizatória do colonialismo “sadio” da Companhia das Índias Ocidentais Holandesas no Suriname e na Indonésia…


Por razões distintas, Guararapes também desperta a desconfiança em setores progressistas. Nomeadamente em correntes ditas identitaristas. Para essas áreas, é preciso manter, no mínimo, a postura cética ante a apologia de um movimento conduzido por elementos da oligarquia colonial “branca” e “patriarcal”. Embora justificada, a suspeita de parte da opinião de esquerda abstrai um nexo importante na análise dos bastidores das Guerras Holandesas: o papel de afrodescendentes e caboclos indígenas no conflito.


Conforme a crônica registra, os proprietários de engenhos e comerciantes de Olinda, nos primeiros tempos da ocupação batava, conviveram muito bem com os invasores, inclusive João Fernandes Vieira. Não há segredo, o futuro líder militar da resistência tornou-se frequentador assíduo da residência do Príncipe Maurício de Nassau e grande devedor de empréstimos às casas de crédito holandesas. Em português claro, por ação ou omissão, os interesses mais bem situados da Colônia buscaram um acordo com os ocupantes. Como se não bastasse, além de toda falta de ímpeto beligerante da aristocracia do açúcar, também merece ser destacada a desarticulação militar da autoridade metropolitana, aparato incapaz de assegurar a presença de tropas e o envio de suprimentos necessários ao prosseguimento da guerra (Decerto, a vigência da unificação forçada das Coroas de  Portugal e Espanha, no período conhecido por União Ibérica, constituiu um dos principais entraves a uma efetiva arregimentação de forças contra o ocupante holandês).


Quem manteve acesa a chama da luta pela retomada do território de “Pernambuco” – mais uma vez é preciso repetir que o “Brasil” ainda remontava a uma abstração nesta conjuntura – foram os elementos de extração popular, esses muito numerosos entre as unidades combatentes. Em um dos seus livros clássicos, Nelson Werneck Sodré reproduz o conteúdo de uma carta dirigida às autoridades holandesas, subscrita pelo “Governador” Henrique Dias, que era preto forro, capitão do mato e um dos comandantes das formações nativas. Selecionei um trecho deste documento, indício da disposição da raia-miúda levar o conflito até as últimas consequências, mesmo sem apoio das elites dirigentes:


(…) “Meus senhores holandeses, meu camarada, (Felipe) Camarão, não está aqui, porém eu respondo por ambos. Saibam vossas mercês que Pernambuco é sua pátria e minha, e que já não podemos sofrer tanta ausência dela; aqui havemos de perder vidas, ou havemos de deitar vossas mercês fora dela, ainda que o Governador-Geral e Sua Majestade nos mandem retirar para a Bahia, primeiro que o façamos havemos de responder-lhes, e dar razões que temos para não desistir desta guerra.”(…)


A repulsa ao ocupante, no caso da fala do Governador dos negros, Henrique Dias, sugere mais do que a defesa do território e sua destinação econômica, confunde-se com a própria manutenção da vida, vide a petição de princípio abaixo:


“Senhores Holandeses. São tão manifestos e claros os embustes e enredos de vossas mercês, que até as pedras e os paus conhecem seus enganos, aleivosias e traições; não falo de mim que com a perda de minha saúde e derramamento de sangue me fiz doutor no conhecimento desta verdade. (…) (p.58)


Extraídos da experiência dos participantes da linha de frente do conflito, os fragmentos em epígrafe confrontam as percepções assinaladas nas produções historiográficas oficialistas (no caso, as de Oliveira Lima e Varnhagen). Mas, isso não é tudo. Tais pronunciamentos permitem verificar a emergência de uma grande ambiguidade na base do mito de origem associado a Guararapes. Nomeadamente, a oposição entre representações das origens do Brasil construídas de cima para baixo, nucleadas a partir das noções de território (ou de seu sucedâneo natural, o Estado) e ideações assentadas sobre o elemento da soberania popular, de corte horizontal, associadas aos contingentes de base da pirâmide social.


Transformada, literalmente, em paisagem à beira de uma rodovia, essa tensão sobre relatos de fundação do país, ao longo da história, veio produzindo clivagens sobre o imaginário da sociedade brasileira. As Forças Armadas, em particular o Exército, não puderam se afastar da influência e do entrechoque dessas formações discursivas antagônicas.   


O Século XIX: Do desprestígio à tutela da nação


No conto “O Espelho”, de Machado de Assis, notável mergulho na psique humana, presumivelmente ambientado na década de 1850, a personagem principal vê sua estima elevar-se providencialmente, ao ser nomeado para o posto de alferes e ganhar uma farda, verdadeiro emblema de prestígio no círculo das relações pessoais que o cercam:


“-Tinha vinte e cinco anos, era pobre e acabava de ser nomeado alferes da guarda nacional. Não imaginam o acontecimento que isto foi em nossa casa. Minha mãe ficou tão orgulhosa! Tão contente! Chamava-me seu alferes. Primos e tios, foi tudo uma alegria, sincera e pura. Na vila, note-se bem, houve alguns despeitados; o choro e ranger de dentes, como na escritura; e motivo não foi outros senão que o posto tinha muitos candidatados e que estes perderam (…)”   


Detalhe: o corpo militar supostamente cumulado do reconhecimento social mencionado no texto, vem a ser a Guarda Nacional, não o Exército. Pois é a Guarda Nacional (em conjunto com a Marinha, o Judiciário, a Diplomacia e a representação parlamentar), uma das instituições nas quais a elite vai buscar o provimento de seus quadros, de maneira preferencial, naquela oportunidade. Grande observador dos meandros da hierarquia social do seu tempo – mas sem descurar jamais da maestria estilística – Machado de Assis, em escritos posteriores, irá mostrar por meio de seus personagens, a progressiva mudança desse quadro. É certo, porém, até meados da segunda metade do Século XIX, o Exército reorganizado por Pedro I, em 1824, após o processo de autonomia política do país, com raras exceções, consiste numa tropa pouco valorizada em termos de remuneração e dos status de seus membros. Esse efetivo reúne, em sua maioria, mestiços e negros libertos em seus escalões majoritários, bem como indivíduos recrutados junto à incipiente classe média, com vistas a integrar a sua oficialidade.


Para muitos, trata-se, portanto, de instituição popular e democrática. E, exatamente por isso, capaz abrigar em seu interior, por toda a vigência do Primeiro e Segundo Reinados, as tensões ideológicas presentes na sociedade brasileira.  Ao evoluir do tempo, esse mesmo exército, ainda sofrerá o impacto de ideias tidas por radicais, como o republicanismo e o abolicionismo, reforçando a sua imagem de aparato permeável ao clamor das ruas. Com certa razão, não serão poucos aqueles capazes de vislumbrar neste corpo militar o elemento de uma nacionalidade construída a partir dos anseios do povo.


É uma percepção exagerada, sem dúvida. Mas assentada sobre a realidade. Afinal, de todas as instituições irradiadas a partir da sociedade escravocrata, o exército é a corporação com menos condições de desenvolver preconceitos raciais e de casta, no período. Isso porque a presença de negros e/ ou pobres em suas estruturas de comando e obediência dificulta a submissão pura e simples aos desígnios das oligarquias. Nessas condições, o elemento fardado – pertencente a unidades de tropa regulares – nada obstante o seu papel na preservação da ordem e do aparelho de Estado, já não se confunde com a figura do capanga ou do jagunço a soldo dos mandonismos regionais. Essa sutil distinção responde pelo grau de legitimidade crescente das ações (e dos efetivos) do Exército ao longo de todo o século XIX,  especialmente quando a Força traz para si – ainda em conjunto com as Guardas Nacionais  e Marinha – a tarefa de reprimir, a ferro e fogo, as rebeliões contra a Centralização Monárquica ((Balaiada, Sabinada, Cabanagem, Farroupilha, Revolução Praieira, entre outras) ou ainda combater as tropas de Solano López, nos conflitos pelo controle do Bacia do Rio da Prata. Ações, no mínimo questionáveis, mas que passaram, nas lentes de uma certa historiografia, como defesa da integridade territorial do país.


Para Sílvio Romero, a década de 1870 anuncia uma enorme alteração na vida social, política e cultural do Brasil. Por toda parte, acumulam-se sinais de mudança. O mais notável desses processos, sob o ponto de vista das estruturas de dominação, aponta para o desgaste da Monarquia e de seu principal instrumento de coesão da malha estatal. Qual seja? O poder moderador. Sempre astutas, as elites buscam preencher o vazio progressivamente deixado pela desagregação da autoridade exercida pela Casa de Braganca. Para tanto, divisam a necessidade de mobilizar o apoio de um ator emergente na cena política do Segundo Reinado, o Exército. Antes visivelmente desprezado, esse contingente militar encontrará a trajetória do reconhecimento público ao fim da Guerra do Paraguai.


Expressão típica dessa era, Floriano Peixoto – oficial de artilharia – inaugura, na ocasião, um discurso de crítica aos poderes constituídos, até hoje em vigência. Faz parte dessa retórica, o uso de termos destinados a preparar o terreno para a necessidade de soluções autoritárias em face da “podridão que vai por este país” e que demanda “uma ditadura militar para expurgá-la”. Nem as pitadas de hipocrisia estão excluídas da arenga do futuro presidente da República: “como liberal que sou não posso querer para o meu país o governo da espada”.


Os limites desse radicalismo de fachada positivista não demoram a se manifestar. Nem poderia ser diferente. Tanto para aqueles que empalmam o poder após o 15 de novembro quanto para os que o desocupam, a essência da governabilidade equivale a “manter a ordem” Serve de demonstração dessa simbiose de interesses o massacre do Arraial de Canudos.


Formalmente ocorrida quando os militares já “devolveram” o poder aos civis, por meio da eleição de Prudente de Moraes, a repressão levada a cabo no Sertão da Bahia, une os dois partidos tidos como inconciliáveis: a jovem oficialidade jacobina e os políticos reciclados do período imperial. Dessa forma, esquecendo momentaneamente suas diferenças, os antagonistas unem forças para esmagar – sem hesitação e com requintes de brutalidade – a insurgência dos caboclos fanatizados pela experiência da miséria. (Nos dias de hoje, com a distância permitida pela ação do tempo, inexiste dúvida quanto ao caráter de terrorismo de Estado presente neste episódio. Uma compreensão bem distinta daquela corrente na opinião pública há pouco mais de 100 anos. Naquele momento, prevaleceu a versão da necessidade do uso justificado da violência para pôr fim ao levante  monarquista (sic), liderado por Antonio Conselheiro).


Euclides da Cunha, ele mesmo oficial de engenharia, antes de tomar partido resoluto do heroísmo dos sertanejos descalços do Belo Monte, segue para a cobertura jornalística patrocinada pelo jornal O Estado de São Paulo, em 1897, convencido do caráter civilizatório e modernizante da ação do Exército naquela terra devastada. Sua correspondência pessoal acusa essa falha de percepção inicial, posteriormente corrigida nas páginas imortais de Os Sertões:


“Depois de nossa vitória, inevitável e próxima, resta-nos o dever de incorporar à civilização estes rudes patrícios que – digamos com segurança – constituem o cerne da nossa nacionalidade”


Quem somos o “nós” a que se refere o plural majestático de Euclides? Pelo visto, ás vésperas, do século XX, estamos falando da  nação republicana que se abre ao protagonismo das emergentes camadas médias urbanas, que tem no Exército uma das suas colunas avançadas, mas que após a domesticação do jacobinismo florianista, cada vez mais, irá se integrar, por décadas, ao projeto das velhas elites conservadoras.  


E, quanto à demanda pela “incorporação” do “cerne da nossa nacionalidade” ao contrato social, as multidões subalternizadas terão de esperar por uma segunda chance ao fim da movimentada década de 1920…


Entre o progresso social e a defesa da ordem


Já de antes do colapso da Primeira República, o Exército vai confirmando a sua condição de instrumento de mobilidade social de indivíduos de origem humilde, gente oriunda de frações menos favorecidas das classes médias, em busca de oportunidades. Não faltam relatos dessa dinâmica. Entre tantas fontes, o depoimento do Capitão Luiz Carlos Prestes:


“(…) só fui para a Escola Militar porque era o único lugar onde poderia estudar Engenharia (…). quer dizer, a pequena burguesia mais pobre ia justamente para Escola Militar, e isso deu um caráter democrático, particularmente ao Exército brasileiro, que participou e vem participando em geral de todas as lutas de nosso povo (…)”  


Novamente, é possível extrair da fala do Cavaleiro da Esperança, a referência ao caráter popular e democrático do Exército (uma opinião bastante corriqueira entre elementos de esquerda até o advento do golpe de 1964). Ilusórias ou não, essas impressões têm seu fundamento em fatos, repita-se. Há uma flagrante sintonia entre a agitação militar e os movimentos contestatórios destinados a redefinir os contornos da sociedade brasileira por toda a extensão das seis primeiras décadas do Século XX. Correntes de opinião como o Comunismo, fascismo (em feição cabocla e integralista) e nacionalismo encontram representação não apenas entre os efetivos da Força Terrestre, mas também se disseminam pelos corpos da Marinha e Força Aérea (nessa última, após a II Guerra Mundial). Chega a ser surpreendente, entretanto, constatar a presença de uma inspiração comum aos responsáveis por toda essa   inquietação política: o tenentismo.


Variedade de consciência ideológica nascida da insatisfação das camadas médias urbanas ante o estreitamento dos canais de participação políticas proporcionados pelo pacto oligárquico, com suas eleições fraudadas e o mandonismo das elites agrárias, o tenentismo pode ser enxergado, em linhas gerais, na forma de um republicanismo (pretensamente radical) em favor da modernização da sociedade brasileira, estagnada por toda a vigência da chamada República Velha. Por conta disso, há fortes elementos de reciclagem de temas já presentes na versão brasileira da doutrina comtiana: a valorização da ciência e do progresso técnico e do ativismo de minorias ilustradas.


Desde sempre um conservador, o ex-presidente do ciclo militar Ernesto Geisel, em depoimento tomado em meio à década de 1990, sintetizou o conjunto de fatos responsáveis pelo surgimento de uma sensibilidade de corte tenentista, com a sua aversão aos políticos, ditos “casacas”:


“No fim do século passado o Exército se esforçou para ganhar a Guerra do Paraguai. Fomos para lá sem tropa treinada, sem equipamento e sem grande apoio, mas vencemos. Quando a tropa voltou, descobriu que os “casacas” não lhe davam importância. Além disso, formou-se um sistema de ensino muito eficiente, talvez o mais eficiente que devesse ser para tamanha falta de meios. Os oficiais iniciaram-se nas ideias positivistas, começaram a discutir a validade do poder nas mãos dos “casacas”, e proclamou-se a República. Primeiro veio o Deodoro, depois o Floriano, que não era um homem culto mas era macho e se não fosse ele este país tinha ido à breca. Depois do Floriano os “casacas” retomaram o poder, e aos poucos formou-se aquele clima de agitação que resultou na Revolução de 30(…).”


Na vigência desse ideário salvacionista, amoldável à esquerda e à direita pelos tenentes e seus aliados (o principal deles, Getúlio Vargas), o Brasil faz torna-se mais urbanizado e industrializado. Começa, sem sombra de dúvidas, a ajustar contas com o subdesenvolvimento e a sonhar alto. São evocativos desse pêndulo opondo progressismo e acomodação a própria revolução de 1930, de um lado e, noutra extremidade, o fechamento com Estado Novo, em 1937. No tenentismo coexistem, sem nenhuma harmonia, sob o predomínio aliás do conflito, tendências alinhadas à mudança com o desejo contraditório e atávico pela ordem, tão caro ao desenvolvimento das Forças Armadas no país.


A acomodação das diversas ideologias políticas sob um guarda-chuva comum do tenentismo, pelo que se pode especular, experimenta um abalo a partir do segundo pós-guerra mundial, com a ascensão dos Estados Unidos ao status de superpotência global. São significativos os impactos desse processo. Fortemente iliberais desde 1930, boa parte das instituições de Estado brasileiras,  entre as quais, o segundo maior partido do país, a UDN (União Democrática Nacional) , passam a abraçar o ideário do livre mercado e da crítica ao setor público da economia, para o entusiasmo da fração mais consolidada da burguesia nacional, em boa parte sediada em São Paulo. Essa rearrumação do espectro político, como não podia deixar de ser, atinge fortemente as Forças Armadas, sendo indício da força de tal deslocamento, a fundação da ESG (Escola Superior de Guerra), em 1949. Da teoria à prática, os golpes e tentativas de subversão da legalidade democrática ocorridos desde então, buscam seus paradigmas nas ideias veiculadas por essa cópia do War College estadunidense.  


Nessa quadra histórica, o enfrentamento ideológico entre uma ala democrática e nacionalista das Forças Armadas, orientada pela produção teórica do ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) e os partidários do liberalismo entreguista da UDN é real, mas restrito a minorias. Por boa parte da vigência do regime de 1946, a imensa parcela dos contingentes fardados permanece conservadoramente alheia a tais debates, embora discretamente apoiadora de iniciativas como a criação da Petrobrás.    


Ditadura Civil-Militar: anticomunismo e projeto nacional autoritário


Sob os influxos da guerra fria, o expurgo das correntes nacionalistas e de esquerda das Forças Armadas, em 1964, torna essa corporação, como não poderia deixar de ser, mais homogênea em termos ideológicos. O que não significa dizê-las monolíticas. Num primeiro momento do golpe, a ala liberal-conservadora, favorável ao alinhamento automático com os EUA, parece predominar, inclusive indicando o presidente general (Castelo Branco) e o demiurgo da política econômica (Roberto Campos). Porém, a partir da posse de Costa e Silva, e principalmente na sequência da espiral deflagrada com a edição do AI-5, o regime assume, de forma paulatina, outro tipo de características, empenhando-se na execução de um projeto nacional assentado no reforço do setor público da economia, cultivando ainda certo grau de autonomia em face dos interesses das grandes potências ocidentais. Sanguinária em relação aos movimentos de contestação, particularmente os de natureza armada, a ordem inaugurada em 1º de abril não esconde sua nítida inspiração autoritária. Mesmo assim, é uma ditadura com características particulares: rodízio de ditador; realização periódica de eleições legislativas; funcionamento da Suprema Corte (o STF); entre outras institucionalidades de fachada.


Visceralmente anticomunista, a mentalidade a perpassar todo o conjunto das forças armadas, no período, exibe diferentes matizes. O mais extremado, denominado pela imprensa pelo epíteto de linha-dura, emerge sem constrangimento, na fala do Brigadeiro João Paulo Penido Burnier, ex-aluno da Escola das Américas, no Panamá, centro de formação de oficiais mantido pelo stabilishment estadunidense:


“Quando fomos fazer o curso de informações (…), encontramos oficiais de vários países sul-americanos: Argentina, Chile, Peru,  Venezuela, México,  praticamente todos os países da região. Todos sendo formados dentro da ideia geral de combater o comunismo.”


Coesa e mobilizada, essa linha-dura protagoniza eventos de relevo no curso do regime militar (o mais sério dentre os quais, a tentativa frustrada de golpe de Estado, liderada pelo General Sílvio Frota, em 1977). Todavia, falta a esse agrupamento, é de reconhecer, uma consistência programática maior.


Mais estruturado do que o reacionarismo rudimentar da extrema – direita militar, o discurso sorvido na fonte dos estudos de geopolítica obteve ampla ressonância. Notadamente, a produção de Golbery do Couto e Silva. Aliás, no interior da obra desse último, podem ser identificados os principais componentes da estratégia de desenvolvimento com segurança, em voga por toda a vigência dos 21 anos do consulado fardado. Por certo, não há condições de dissertar aqui em profundidade sobre tais concepções. Cabe apenas mencionar o esforço teórico de Couto e Silva com vistas a promover a introdução de elementos de livre mercado em economia, todavia conjugados à defesa de um Estado forte e de um poder político centralizado. Nessa chave de interpretação da realidade, cabe a esse mesmo Estado “ampliar cada vez mais a esfera e o rigor do seu controle sobre uma sociedade já cansada e desiludida do liberalismo fisiocrático de eras passadas”.     


Para que não reste dúvida da distância que separa o ideário do General Golbery das crenças dos paisanos Eugenio Gudin e Roberto Campos, segue o trecho em seguida – vazado em estilo dos mais empolados – no qual, a pretexto de advertir os países centrais da insuficiência das terapias econômicas preceituadas pelos EUA, o General deblatera contra os dogmas do liberalismo:


“(…) nunca bastarão as prédicas mais ou menos insinceras sobre as virtudes inexcedíveis e sem jaça da livre empresa, a doutrinação cínica em favor da eterna benemerência do capital estrangeiro, as teses cediças sobre as vantagens inigualáveis de um  livre  -cambismo   já defunto e as maravilhas da divisão internacionais do trabalho, as apregoadas vocações agrícolas ou as repetidas demonstrações  da perfeição admirável do mecanismo automático de mercado livre (…)


Cultor do planejamento econômico central, tema ao qual dedicou inclusive um livro inteiro, Couto e Silva e os gestores públicos associados ao autoritarismo almejam, sem êxito, a retomada dos temas lançados em 1930, agora debaixo das condições proporcionadas pela ruptura institucional de 1964.


Essa resiliência tenentista, predominante na ditadura até sua virtual exaustão, em 1985, acusa a obsessão dos militares em realizar reformas, por meio de um sistema de planejamento econômico sem a participação popular e muitas vezes, contra a participação popular. (É bem verdade, um programa muito mais inclusivo do que o dos liberais da República Velha e da atualidade).  Nesse sentido, o encaminhamento da questão fundiária, por sua importância,  ilustra bem tais paradoxos: na vigência do Regime dos Generais, foi criado o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e garantida a indenização por títulos públicos e regulados os módulos de extensão de terra para desapropriação. Essas medidas, nada obstante, surtiram pouco ou nenhum efeito sobre o dramático fenômeno da concentração de terra e pobreza no campo. O mesmo malogro – por vezes absoluto ou relativo, dependendo do caso concreto – comprometeu o alcance e eficácia dos programas de moradia popular, seguridade social e assistência médica, elaborados nos anos 1960 e 1970, apenas para mencionar algumas áreas de extrema relevância.


Assim, buscando exorcizar o seu próprio demônio interior, ou seja, o medo da estagnação assente às políticas liberais da República Velha, a ditadura fez do crescimento econômico proporcionado pela expansão da manufatura e dos serviços um fim em si mesmo, atingindo taxas apenas alcançadas depois pela China e demais tigres asiáticos. O que teria sido uma grande façanha se não tivesse sido acompanhado da pior distribuição de renda do mundo.


Após a redemocratização, a conversão liberal


Por tudo que se pode observar, num comportamento de grande regularidade histórica, os militares vieram (não em sua totalidade, porém em sua parcela majoritária), desde o século XIX até recentemente, assumindo uma filiação conservadora. Em particular, identificando-se com a tendência a que poderíamos denominar conservadorismo estatista. Ou seja, a vertente do debate político composta por forças da tradição, com larga representação entre as oligarquias rurais e as burocracias do serviço público que enxergou no Estado o principal polo de articulação da vida pública, secundarizando o papel de instituições da vida social tais como o mercado (pilar da cosmovisão liberal) ou a soberania popular (axial à representação progressista). Nos últimos dois séculos, esses conservadores, cumpre reconhecer, moldaram o aparelho estatal para operar medidas de “mudança dentro da continuidade” das estruturas políticas e sociais brasileiras.


Legatária de instituições pré-existentes ao processo de autonomia política ocorrido em 1822 e, portanto, portadora de uma agenda de longo prazo, a corrente conservadora logrou diluir o potencial disruptivo de vogas teóricas como o positivismo e movimentos políticos como o tenentismo, domesticando-os em versões de conservadorismo sob roupagens progressistas.  Sempre fiel ao objetivo de tutelar/arbitrar o processo político em favor da manutenção da ordem.


Vale assinalar, no entanto, que desde a redemocratização do país, há cerca de 40 anos, aparecem indícios capazes de indicar a modificação do quadro geral das complexas relações entre discurso, classes sociais e ideologia, em todos os níveis da sociedade brasileira, com repercussões no âmbito das FFAA, tema do presente texto.


No rol das mutações experimentadas nenhuma apresenta tanta novidade quanto a gradativa alteração do perfil social dos elementos engajados no Exército. Segundo pesquisas quantitativas, em meados dos anos 1940, apenas 20 por cento dos cadetes matriculados na AMAN, compunha-se de filhos de militares. Já em 1990, esta proporção já havia subido para 61 por cento. Esse dado reforça a percepção de que o grau de mobilidade social proporcionado pela carreira vem sendo derruído, aos poucos. Seria este o indicativo da presença de elementos de formação de casta? Ou ainda do triunfo da demanda em favor de ordem e disciplina – inata a qualquer corporação castrense – por sobre as últimas sobrevivências progressistas? O certo é que, cada vez mais elitizada, a carreira das armas se distancia do papel aportado sob a vigência do Império, da Primeira e Segunda Repúblicas (1946-1960). Longe até do desempenho apresentado durante a vigência da Ditadura Civil-Militar. Seu posicionamento em crises recentes como a do o golpe de 2016 e da conjuntura fascistizante iniciada com a eleição de Bolsonaro serve para comprovar essa percepção, algo pessimista.


A modificação do perfil social da tropa pode estar na origem do aparecimento de um discurso difuso e genérico em favor de uma “mudança de cultura” no âmbito das corporações militares, inclusive no Exército. Um anseio que parece encontrar sua tradução mais atualizada na intervenção prática e teórica do General Eduardo Villas Boas, Comandante da Força Terrestre, entre janeiro de 2015 e março de 2019. Em recente livro de entrevistas, o militar sustenta a seguinte posição:


“(…) Organismo fechado, de forte cultura institucional, aos poucos fomos sendo superados. Essa tendência cresceu exponencialmente a partir da revolução tecnológica. Nosso conhecimento continuou evoluindo linearmente, enquanto o conhecimento geral seguia uma curva ascendente. À medida que o tempo passava, maior se tornava o distanciamento do mundo ao nosso redor. Isolados, íamos perdendo a sensibilidade necessária à compreensão da natureza dos conflitos em atuávamos. Para recuperar esse espaço perdido, fazia-se necessária uma ruptura que somente a transformação proporcionaria. No mundo, o que chamamos de transformação corresponde a mudanças que provoquem impacto na cultura institucional, por se tratar de uma ação complexa e condicionante do futuro das instituições e tem merecido especial atenção de executivos de renome e produzido extensa literatura.” (p.143).


Em vista do que se assiste, em episódios recentes, a maior consequência dessa aspiração à mudança se acha testemunhada na esfera do ideário político. Isto é, em pronunciamentos de lideranças militares, entre as quais o próprio Villas Boas, há uma aposentadoria do antigo discurso conservador, voltado para a balizas do “desenvolvimento” e “segurança”, na versão condensada pela ditadura de 1964. Em seu lugar, emerge uma fala liberal, ou melhor, neoliberal, em favor do ajuste do país às circunstâncias de um mundo globalizado, sob a liderança das potências ocidentais, em destaque os EUA, guardada a estrita obediência às regras de procedimento tais como a do chamado “Consenso de Washington”.  Não se encontra nada de aleatório portanto, na adesão do comandante nomeado acima às “reformas econômicas” assinaladas no programa “Ponte para o Futuro”, encaminhadas por Michel Temer.   


Já nos ensinava o linguista Bakhtin que tão importante quanto aquilo que se diz vem ser a o não dito, a omissão, o silêncio deliberado, o recalque discursivo. Essa referência surge a propósito da leitura do já citado livro de entrevistas do General Villas Boas. Até podemos entender uma certa parcimônia ou ainda reserva do chefe militar ao se manifestar sobre temas políticos estricto sensu. Uma atitude ditada pelo afã de sinalizar uma conduta de estrito profissionalismo e distância do comportamento intervencionista exibido pela caserna ao longo da história política brasileira (nada obstante a pressão exercida sobre o STF, em 2018, quando do julgamento do habeas corpus para liberdade provisória do ex-presidente Lula). Não se compreende, no entanto, a total omissão de Villa Boas, ao longo de mais de 200 páginas de seu depoimento, sobre um dos mais importantes temas conexos à sua alçada: a necessidade de retomada urgente de um projeto nacional de desenvolvimento.


Por serem especialistas em defesa, os militares sabem da importância de readquirir capacidade de industrialização e capacitação científico-tecnológica. Conhecem ainda a necessidade da celebração de parcerias entre governo, universidade e centros de pesquisa das FFAA visando a nacionalização dos insumos do armamento forçosamente utilizado pelas três Forças no desempenho de suas missões constitucionais. Mais do que tudo, estão cientes da necessidade de romper nossa dependência das tecnologias e elementos de logística elaborados nos países centrais e buscar uma autonomia sem a qual não existe qualquer possibilidade de garantir a integridade do território brasileiro, com suas extensas fronteiras. Enfim, os militares atuais, conforme a entrevista do General Villas Boas sugere, têm conhecimento desses gargalos, porém agem como se não soubessem. O contraste com épocas anteriores chega a ser gritante: no passado, ainda que demonstrando falhas e incompreensões, as Forças Armadas brasileiras sempre foram sensíveis à questão do desenvolvimento próximo às suas áreas de atuação. Só a conversão neoliberal (provisória ou permanente, ainda não se sabe), explica essa mudança de atitude.


Mudança para valer?


Ao final deste texto, uma nota pessoal: entre as décadas de 1980 e 1990, fui casado com uma companheira que é filha de militar, experiência capaz de me permitir travar diálogos com elementos fardados em ocasiões informais. Conheci vários tipos de pessoas. Alguns progressistas (poucos), outros conservadores (muitos). Todos, porém, nacionalistas, pelo menos no discurso. Essa era a cara do Exército na minha nada científica amostragem pessoal há cerca de 30 anos atrás.  Pelo que acompanho hoje, pela mídia, essa fisionomia ideológica transformou-se radicalmente.  Sou levado a crer que, se durante a vigência da ditadura os oficiais das FFAA tivessem a mentalidade  atual, todo o setor público da economia (incluindo Petrobrás, Caixa Econômica e Banco do Brasil) haveria sido alienado, conforme ocorreu em países vizinhos como a Argentina, Uruguai e Chile. Da mesma forma, iniciativas de pesquisa vitoriosas como a Embrapa e a Embraer sequer existiriam. Com isso, o país seria muito mais pobre, desindustrializado  e desigual do que é.


Por isso, a título de contribuição ao debate, os militares não me perguntaram, mas assim mesmo, respondo. Ou melhor, proponho. Se as FFAA estão interessadas numa mudança de cultura, dispostos a renunciar a certas heranças, não faz sentido renegar a defesa da soberania do país. Se algo tem de mudar é a tendência à intervenção e à tutela sobre a vida política. Nenhum Estado do mundo, em qualquer latitude, deu certo sem a submissão dos elementos armados a um poder constitucional e civil.

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1. Entre inúmeros títulos, destinados à abordagem dos mais variados aspectos da chamada questão militar, recomendo a leitura de MARTINS FILHO, João Roberto (Org.). O Militares e a Crise Brasileira. São Paulo: Alameda, 2021.

2. Não se incluem entre os objetivos do presente texto aprofundar a controvérsia em torno do termo ideologia, esse último detentor de um sem-número de acepções no interior no debate marxista. Ainda assim, há necessidade de uma aproximação dessa categoria, na qualidade de pressuposto metodológico. Com essa expectativa, se anuncia produtivo, a meu ver, o diálogo com a noção de ideologia recolhida por Raymond Williams a partir da leitura de linguistas soviéticos (Volosinov, entre outros). Por essa ótica, os domínios do ideológico não estariam localizados num sistema de “crenças ilusórias” ou “falso consciência” de indivíduos ou determinados grupos sociais, como as classes, mas sim na “dimensão da experiência social na qual os significados e valores são produzidos”. WILLIAMS, Raymond. Marxismo e Literatura.1 ed. tradução de Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979, p. 61.

3. LIMA, Oliveira. Formação Histórica da Nacionalidade Brasileira. Brasília. Edições do Senado Federal, 2012, p. 88.

4. DIAS, Henrique citado por SODRÉ, Nelson Werneck. História Militar do Brasil. 2 ed. São Paulo. Expressão Popular, 2010, p. 59.

5. Ibidem, p.58.

6. ASSIS, Machado de. Obra Completa. Rio de Janeiro. Nova Aguillar, 2004, p. 345.

7. SODRÉ, Nelson Werneck. História Militar do

8. Brasil. 2 ed. São Paulo. Expressão Popular, 2010, p. 163.

9. Para informações sobre o funcionamento da Guarda Nacional ver SODRÉ, Nelson Werneck. História Militar do Brasil. 2 ed. São Paulo. Expressão Popular, 2010, p. 153.

10. ROMERO, Silvio citado por CANDIDO, Antonio. O Método Crítico de Silvio Romero. 4 ed. Rio de Janeiro. Ouro sobre Azul, 2006, p. 219.

11. Para o desgaste da Monarquia ver PRADO JÚNIOR, Caio. Evolução Política do Brasil. 16 ed. São Paulo. Brasiliense, 1966, p. 100.

12. PEIXOTO, Floriano citado por PENNA, Lincoln de Abreu. A República dos Golpe: da Conciliação a Rupturas. Rio de Janeiro; E- Papers, 2021, p. 37.

13. Ibidem, ibidem

14. Ibidem, ibidem

15. Ao mencionar os limites e contradições do radicalismo dos militares florianistas, não pretendo negar o caráter avançado do seu programa político-social, que previa a adoção de medidas como o aprofundamento da separação entre Estado e religião, fim do voto censitário, ou ainda o esforço de industrialização da nossa atrasada sociedade agrária, entre outras propostas cuja a aplicação se viu frustrada, no todo ou em parte, pela oposição encarniçada das oligarquias. Ver CARONE, Edgard. Revoluções do Brasil Contemporâneo. 2 ed. São Paulo: Difel.1977, p. 13.

16. CUNHA, Euclides da citado por ANDRADE, Olímpio de Souza. História e Interpretação de Os Sertões. 4 ed. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2002, p. 147.

17. PRESTES, Luiz Carlos citado por CUNHA, Paulo Ribeiro da Cunha. Um Olhar à Esquerda: A Utopia Tenentista na Construção do Pensamento Marxista de Nelson Werneck Sodré. Rio de Janeiro: Revan, 2002, p. 117.

18. GEISEL, Ernesto citado por GASPARI, Elio. A Ditadura Derrotada. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 34.

19. BURNIER, João Penido ouvido em Os anos de Chumbo: Memória Militar sobre a Repressão. Orgs. Maria Celina D’Araújo, Gláucio Ary Dillon Soares e Celso Castro. Rio de Janeiro: Relume Dumará, p.183.

20. COUTO E SILVA, Golbery do citado por GASPARI, Elio. A Ditadura Derrotada. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 130.

21. COUTO E SILVA citado por CARVALHO, Tiago Bonfada. hhttp/funag.gov.br/loja/download/627-geopolítica brasileira_e_relações_internacionais_.pdf2010, p.87.

22. Para uma aproximação ao termo conservadorismo estatista ver LYNCH, Christian Edward Cyril. O Caleidoscópio Conservador: A Presença de Edmund Burke no Brasil. In: KIRK, Russel, Edmund Burke, Redescobrindo um Gênio. 1 ed. Tradução Marcia Xavier Brito. São Paulo: É Realizações, 2016, p. 496.

23. BARROCAL, Andre, “Politização Explícita”, Carta Capital, 13 de outubro de 2021, p. 21.

24. VILLAS BOAS, Eduardo citado por CASTRO. Celso (org). General Villas Boas, Conversa com o Comandante. Rio de Janeiro: FGV, p. 143.

25. Em sintonia com a nova “mentalidade”, os quadros reunidos em torno de influente think tank militar definem-se como conservadores, em matéria social e liberais, em termos econômicos. SAGRES. Instituto. Projeto de Nação, Cenários Prospectivos – Foco- Objetivos, Diretrizes e Óbices.igbv.org

26. Para adesão do General Villas Boas ao programa de contrarreformas neoliberais de Temer ver ibidem, p. 206.

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BIBLIOGRAFIA


BARROCAL, Andre, “Politização Explícita”, Carta Capital, 13 de outubro de 2021.


BURNIER, João Penido ouvido em Os anos de Chumbo: Memória Militar sobre a Repressão. Orgs. Maria Celina D’Araújo, Gláucio Ary Dillon Soares e Celso Castro. Rio de Janeiro: Relume Dumará.


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Ibidem citado por CARVALHO, Tiago Bonfada. hhttp/funag.gov.br/loja/download/627-geopolítica brasileira_e_relações_internacionais_.pdf2010.


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DIAS, Henrique citado por  SODRÉ, Nelson Werneck. História Militar do Brasil. 2 ed. São Paulo. Expressão Popular, 2010.


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MACHADO DE ASSIS, Joaquim Maria Obra Completa. Rio de Janeiro. Nova Aguillar, 2004.


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Marcelo Barbosa da Silva é advogado, pós-doutor em Literatura Comparada pela UERJ e autor de “Esquerda e Projeto de Nação” (Algo a Dizer).

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