Impressões ao calor da hora: a internação de Bolsonaro, as fake news e a conhecida tática de desviar o foco e evocar o mártir, por Daniel Samam


A internação de Bolsonaro trouxe de volta a imagem do mártir político. É a história se repetindo, mas não sabemos ainda se em forma de farsa ou de tragédia. Em 6 de setembro de 2018, Bolsonaro foi esfaqueado no abdômen no meio da multidão em Juiz de Fora (MG).


Não sou dos que credita ao episódio da facada como fator decisivo para a vitória do hoje presidente de plantão, mas também não dá para não considerar como um fato relevante pra incendiar a disputa à época e contribuir para o resultado exitoso de uma campanha focada na negação da política, na narrativa antissistêmica sobre um sistema político arrasado pela Lava Jato.


Pouco depois que a notícia acerca da gravidade do caso de Bolsonaro tomava conta dos noticiários, as redes sociais de Bolsonaro, comandadas pelo "02" Carluxo, postam o martírio do "mito".


O texto com uma foto de Bolsonaro sem camisa fala que o sofrimento atual são consequências "da tentativa de assassinato promovida por antigo filiado ao PSOL, braço esquerdo do PT, para impedir a vitória de milhões de brasileiros que queriam mudanças para o Brasil... Um atentado cruel não só contra mim, mas contra a nossa democracia", escreveu. Com Lula marcando quase o dobro das intenções de voto de acordo com a última pesquisa do Datafolha, a inclusão do PT na postagem foi, com o perdão do trocadilho, cirúrgica.


A saída de cena do presidente tem também uma utilidade imediata. Pode ser um movimento para baixar momentaneamente a pressão. A depender da evolução do quadro de saúde, ainda gera alguma comoção. O que pode, no limite, até impactar nas manifestações de rua.


Bolsonaro encontra-se em seu pior momento, de grande pressão, de revelações de escândalos e irregularidades no Ministério da Saúde pela CPI da Covid e de constante queda da aprovação registrada por diversas pesquisas de opinião.


Por fim, não cabe aqui discutir sobre a veracidade, se o presidente está mesmo doente ou não, mas que o fato da internação e de sua condição de saúde foi explorado no sentido de comover e atiçar, não tenhamos dúvidas.


No mais, a conjuntura nos exige observação, vigilância e mobilização.

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