Autonomismo como referência e expressão da renovação da esquerda, por José do Nascimento Junior


“Odeio os indiferentes.” (Antônio Gramsci)


Escrevo esse texto em homenagem a Marco Aurélio Garcia, Eder Sader, Herbert Daniel, Marilena Chauí, Paulo Sandroni, Carlos Nelson Coutinho, Elisabeth Lobo, Olgária Matos, Felix Guattari e outros que compunham a revista Desvios e faziam uma reflexão sobre o papel dos autonomistas italianos, da autogestão dos conselhos operários e a ação de uma esquerda democrática, inspirados pelos escritos do filósofo grego Cornelius Castoriádis, dentro de uma perspectiva do existencialismo, marxista e crítica, contra as formas autoritárias de gestão social. A disputa cultural no campo do marxismo é também uma disputa sobre socialismo ou barbárie.


As reflexões de esquerda e democracia


Temos que ter claro que a luta de classes no futuro não será enfrentada no contexto da quarta revolução industrial. Antes, essa será uma disputa que ocorrerá no plano das expressões culturais. 


Uma questão que gostaria de introduzir é qual será o futuro das instituições culturais, e em especial os museus, uma vez que são espaços de lutas de classe. 


Sob essa perspectiva, o museu deve buscar novas narrativas de classe social, com vistas a sua própria autonomia, para com isso contribuir no desenvolvimento das demais instituições culturais. 


Uma museologia crítica deve incorporar Marx e Gramsci nas análises das ações.


Os museus devem ser cidadelas da memória e espaços estratégicos para defender a democracia como valor universal.  


Mesmo os museus que são pontos de memória devem superar os populismos analíticos e buscar formas de gestão mais autônomas, o que incluiria ações das comunidades que os integram ou circundam. Essa autonomia é fundamental para o fortalecimento de futuras políticas culturais democráticas que façam frente à burocratização dominante nos Estados contemporâneos. Burocracia esta, que destrói a autonomia das ações culturais e gera clientelismo cultural estatal.   


Somente o discurso não fortalece as ações e pode ser percebido como um tipo de populismo cultural que tenta passar por progressismo. 


O futuro será das revoluções culturais que terão por objetivo fortalecer os grupos sociais locais sem qualquer tipo de tutela política e intelectual. Isso é Autonomismo de fato. Essa é a ruptura com o colonialismo que gera a revolução cultural passiva.


A política de museus deve ter um aprofundamento à esquerda para fortalecer seus aspectos críticos a fim de evitar alianças com mercadores de cultura. 


Essa é a práxis da cultura, como autoconsciência na sociedade moderna: romper com a lógica da sociedade líquida capitalista (Bauman) que transforma o todo da cultura em mercadoria, reforçado pelas classes hegemônicas.


Essa disputa de classes é opressão de uma nação sobre a outra. O século XXI será das revoluções culturais e da ruptura com os mecanismos colonialistas. Até mesmo os países europeus estão fazendo ações de descolonização de países africanos. 


A organização dos trabalhadores da cultura é prioritária e as políticas culturais devem ser redundadas em novos patamares para a formação de uma nova hegemonia.     


Essa é uma mudança de paradigma necessária para refundação da gestão federal da cultura autônoma sem clientelismo estatal em qualquer esfera de governo.


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José do Nascimento Junior é Cientista Social, Antropólogo, Doutor em Museologia e Patrimônio.

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