Lula, Alckmin e o Chile, por Sérgio Batalha


Refleti bastante antes de opinar sobre a provável escolha de Alckmin para vice na chapa de Lula. Minha primeira impressão foi ruim, como a de quase toda a militância petista. Depois resolvi pensar sobre os motivos e consequências desta escolha de Lula.


Um candidato a vice-presidente tem duas utilidades em uma chapa. Pode ampliar o espectro de votantes no candidato a presidente, incorporando um setor da sociedade ou região do país na qual o cabeça tem menor penetração. 


A outra utilidade é selar uma aliança com algum partido ou setor social importante para assegurar a governabilidade. Bolsonaro escolheu Mourão, por exemplo, não pensando nos votos que ele agregaria, mas no respaldo dos militares ao seu governo.


Lula no passado escolheu José de Alencar para ser seu vice-presidente não pela votos que ele traria, mas pelo simbolismo de ter um grande empresário na chapa, tranquilizando o mercado em relação ao futuro governo.


Na minha opinião, erra quem procura na soma de votos o motivo da escolha de Alckmin. Lula mais uma vez quer passar uma mensagem com a escolha. Quer sinalizar que vai unir o país, restaurar a democracia com uma frente ampla contra o fascismo de Bolsonaro, a ponto de escolher um antigo adversário como companheiro de chapa.


É uma mensagem forte, que vale mais do que a atração de um partido ou a sinalização para um setor específico da sociedade. Não creio, sinceramente, que a escolha de Alckmin empurre a chapa para a direita. Ele praticamente entra sozinho na aliança, sem um partido forte por trás.


Creio que essa é a inteligência de Lula. Seria muito mais perigosa uma aliança com um líder de um grande partido da direita. Alckmin estava em relativo ostracismo, embora ainda possua votos em São Paulo. Não vai levar parcela significativa do PSDB com ele.


Há o risco do impeachment, este sim real, já que é possível que a esquerda não ultrapasse o número mágico de 171 deputados para barrar sozinha um novo golpe como o que derrubou Dilma.


No entanto, creio que Lula avaliou esse risco e considerou que valeria à pena assumi-lo. Como sempre, ele confia na sua notória habilidade política e capacidade de comunicação com as massas populares, que o salvaram na grave crise do “mensalão”.


Muitos dizem que Lula poderia escolher um vice-presidente de esquerda, que Boric no Chile venceu a extrema-direita sem fazer este tipo de concessão. Este tipo comparação não tem qualquer lógica. 


O Chile é um país muito diferente do Brasil, tanto no que diz respeito à sua sociedade atual, como também em relação à sua história e economia. A própria ditadura militar chilena foi bem diferente da brasileira, adotando um modelo ultraliberal inteiramente diverso da política econômica do regime militar brasileiro.


O resultado é que a política no Chile tem muito pouco em comum com a política no Brasil. O candidato derrotado Kast tem pouco a ver com Bolsonaro, não fez campanha com a expertise da extrema-direita americana. Seu discurso resgatava elementos tradicionais da política chilena como o liberalismo econômico e o autoritarismo.


Não tenho absoluta certeza de que Lula fez a melhor opção. Provavelmente, ele vai defender melhor a escolha de Alckmin no futuro. Mas tenho de admitir que a escolha de um vice-presidente de direita e antigo adversário do petismo é uma jogada brilhante para sinalizar o conceito de uma ampla frente democrática. 


O que temos todos de entender é que uma chapa não é formada apenas para ganhar a eleição. É fundamental também que ela simbolize uma aliança capaz de governar o país. 


O Brasil vive a maior crise de sua recente democracia e Lula hoje talvez seja nossa única chance de superá-la. Acho que ele merece um voto de confiança por tudo que já fez e por tudo que sofreu na defesa do nosso povo.

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Sérgio Batalha é advogado, professor universitário, especialista em relações de trabalho, além de conselheiro e presidente da Comissão da Justiça do Trabalho da OAB-RJ.

Um comentário:

  1. É só matar o Lula e pronto, terão o candidato do imperialismo na presidência!!!
    O PT e o Lula não estão calculando muito bem esse passo nas próximas eleições!!!

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