Os dez dias que abalaram o Brasil, por Sérgio Batalha

O jornalista americano John Reed escreveu seu famoso livro sobre “Os Dez Dias que Abalaram o Mundo”, descrevendo os acontecimentos culminantes da Revolução Russa em 1917. Não tenho a pretensão de igualar a sua obra que inaugurou o estilo moderno de reportagem, mas os últimos dez dias no Brás merecem um resumo.

Afinal, nos últimos dez dias o STF sepultou as acusações da Lava-Jato contra Lula, definindo a suspeição de Sérgio Moro e liberando sua candidatura para as eleições presidenciais em 2022.

No dia seguinte, a pandemia atinge a marca de 300 mil mortos no Brasil. A pressão sobre Bolsonaro cresce e seu chanceler sofre pesadas críticas no Senado da República. O Presidente da Câmara, seu aliado Arthur Lira, fala na necessidade de mudar o rumo do governo no combate à pandemia e chega a insinuar a possibilidade de impeachment.

Bolsonaro é forçado a demitir seu chanceler Ernesto Araújo, uma das peças-chave da retórica bolsonarista. Acuado, faz uma manobra arrojada, demite o ministro da defesa e flerta com a possibilidade de golpe. 

Os militares reagem, os comandantes das forças pedem demissão e Bolsonaro é obrigado a nomear um ministro do exército contrário ao golpe, alinhado com a visão do alto-comando das Forças Armadas. 

Lula concede uma entrevista histórica a Reinaldo Azevedo, com mais de 500 mil pessoas acompanhando ao vivo, na qual ataca Bolsonaro e lança as bases de seu discurso de campanha, uma frente democrática contra o fascismo de Bolsonaro e a proposta de retomar com o crescimento com distribuição de renda.

Nos últimos dez dias o panorama eleitoral de 2022 se modificou radicalmente. Lula ocupou definitivamente uma postura de liderança na oposição e Bolsonaro acusou o golpe, passando a uma postura defensiva. Sua ameaça de golpe nada mais foi do que uma reação desesperada a um encurralamento do seu governo promovido por setores variados, inclusive por seus próprios aliados do Centrão.

A eleição de 2022 obviamente não está definida, mas a pandemia e o fracasso do governo Bolsonaro o transformaram de favorito a azarão no processo eleitoral. Na oposição, Lula modificou o discurso, transitando de uma frente de esquerda para uma frente democrática ampla. São dez dias que definitivamente abalaram tudo em relação ao Brasil.

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Sérgio Batalha é advogado, professor universitário, especialista em relações de trabalho, além de conselheiro e presidente da Comissão da Justiça do Trabalho da OAB-RJ.

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