O ritmo da crise, por Gilberto Maringoni

Publicado originalmente no Facebook do autor.

1. A questão central da conjuntura é o avanço da pandemia (quase 4 mil mortos por dia) e a falta de dinheiro na mão do povo (R$ 600 e não os R$ 250 de Bolsonaro);

2. Diante disso, é absolutamente incompreensível que a oposição parlamentar não tenha feito um escândalo pela colocação em pauta da MP 1039, que define os R$ 600.

3. A crise criada por Bolsonaro é absolutamente artificial e visa tumultuar o ambiente. O que ele quer? Levar a situação a um beco sem saída que lhe permita tomar alguma medida autoritária. O segredo de operações desse tipo está em radicalizar a política - ou melhor, levar as posições a um extremo - e ampliar sua base de apoio (ou neutralizar posições contrárias). Parece-me que o Genocida não está conseguindo nenhuma das duas, no conjunto da obra. 

4. No Itamaraty e na Secretaria de Governo assumem duas figuras sem brilho. Para a AGU vai o celerado da Justiça, sem muito peso institucional pessoal (nome elegante para pau mandado). 

5. Nas FFAA há alguns entraves. Embora Braga Netto seja um preposto de Bolsonaro, sua Ordem do Dia em comemoração ao golpe saiu quilômetros mais moderada do que eu esperava. Nenhuma citação aos mortos de 35, nada da usual gosma anticomunista castrense. No fundo diz "1964 é passado". Claro que é grave comemorar o fim da democracia, mas o que deveria ser uma apoteose bolsonarista virou uma efeméride burocrática.

6. As nomeações dos comandantes de cada Força constituem o cerne da possível radicalização. Trata-se de obra de engenharia política delicada: intervir nas Armas, não trincar hierarquias e colocar no comando gente com respaldo embaixo. A manobra está em andamento. Repito: não sei se ele conseguirá ser radical e amplo aqui, dadas as labirínticas construções da casta militar. Radicalizar politicamente estreitando base de apoio é jogo de soma menos um.

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Gilberto Maringoni é jornalista, cartunista e professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC.

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