Não será fácil o PT reconquistar a confiança do povo, por Val Carvalho

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Em sua coluna na Carta Capital de 28 de agosto, intitulada “As ideias de dona Maria”, a colunista Esther Solano fala de sua entrevista com uma cabeleireira evangélica da periferia de São Paulo, que no passado votou em Lula mas em 2018 optou por Bolsonaro.

Dona Maria votou em Bolsonaro por acreditar que ele seria um “homem de Deus” e por isso tinha “esperança” das coisas melhorarem. Mas depois das “barbaridades” ditas por ele e de sua reforma da Previdência, ela se decepcionou com o “mito” e se arrependeu do seu voto.

Apesar disso, não votaria mais no PT, mesmo reconhecendo Lula como o melhor presidente do país. Por que? Porque ela acha que “Lula é um grande corrupto”. Se Luciano Huck vier candidato votaria nele, pois tem “cara de bom moço”.

Numa frase de grande significado para a nossa autocrítica, dona Maria diz que “todos os partidos são corruptos, mas o PT traiu o povo”. Tal decepção com o PT se deve a que antes ela nos diferenciava dos outros partidos.

Portanto, ao ser igualado aos demais partidos o PT acabou perdendo sua vantagem moral estratégica. Esse profundo rompimento ideológico, político e eleitoral de parte significativa da base popular (sobretudo no Sudeste) com o PT é o abismo que temos de atravessar para reconquistar a sua confiança.

Um passo muito importante nesse sentido seria um novo e justo julgamento de Lula, dentro das regras constitucionais, como insiste em o ex-presidente.

Com o seu formidável tino político Lula sabe que quando a sua inocência for provado num julgamento sem irregularidades jurídicas ele pode recuperar a confiança daquela parte do povo que lhe virou as costas por ter sido envenenada pela Rede Globo e submetida à lavagem cerebral de pastores e padres bolsonaristas.

Ainda que isso aconteça e permita Lula se aproximar de seus antigos eleitores, o PT continuará com o estigma de corrupto que somente diminuirá com o passar do tempo, a partir da própria experiência política dessa massa popular na luta pela melhoria de vida. É isso que abrirá brechas na blindagem ideológica que lhes impõe as igrejas vinculadas à direita e extrema-direita.

Por isso só parcialmente o PT chegará a essa base popular por via de argumentos ideológicos e valores de esquerda. Nossa reaproximação política será inevitavelmente indireta e dialogando pacientemente com suas decepções no governo Bolsonaro, do mesmo modo como no passado foram as decepções da base popular, primeiro, com Collor, em seguida, com FHC, que a levou a apostar em Lula. Claro que nesse tempo tanto Lula quanto o PT souberam construir as pontes para deixar passar o voto popular.

Dessa vez, no entanto, acreditamos que a conquista da confiança popular será mais rápida devido à memória positiva que a maioria da sociedade tem de sua vida no governo Lula.

De qualquer maneira vou emoldurar esse artigo de Esther Solano como advertência permanente contra a repetição de nossos erros do passado e a perigosa ilusão de que o apoio do povo voltará automaticamente para nós, bastando para isso a libertação de Lula.
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Val Carvalho é militante histórico do Partido dos Trabalhadores.

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