230 anos do Brumário, a revolução cultural da Liberdade Igualdade e da Fraternidade, 1789, que não terminou. A primavera chegará, por José do Nascimento Junior



“O Brasil está algumas revoluções em atraso”

Luís Fernando Verissimo

Em 14 de Julho desse ano estaremos comemorando os 230 anos da Revolução Francesa, nesse tempo que se consolidou os valores de liberdade igualdade e fraternidade para além das fronteiras das francesas.

Esse tema inspirado nessa frase de Luís Fernando Verissimo, e nos significados do lema da Revolução Francesa nos faz pensar nesse novo momento da política no país. Nesse contexto pensar as ações culturais dentro desse cenário recuperar a ideia do “Culto da Razão” como foi pensado pelos “Sans-culottes”, sendo esses compostos os setores mais populares da revolução, tendo como uma das caraterísticas a utilização do barrete Frígio vermelho ou também chamado barrete da liberdade e anticlerical solidificou-se em política governamental oficial em 1792 quando a Primeira República Francesa foi declarada. A maior parte da descristianização da França durante a Revolução foi motivada por preocupações políticas e econômicas e entre a heterodoxia crescente, os conceitos estruturais republicanos.

Esses valores foram incorporados por todas as instituições públicas na França ao observarmos as escolas esses lemas está presente na entrada em quase todas. Lembrando que a França nesse período já passou por governos de diversas orientações políticas, isso demostra que o papel republicano e democrático é mais amplo que esta ou aquela posição ideológica em particular.

Nessa direção que devemos pensar como se forjaram esses valores em pleno processo revolucionário de queda de uma monarquia absolutista, onde a burguesia e os setores populares se uniram para criar uma nova sociedade naquele contexto o qual Assembleia Nacional, o parlamento, representava a diversidade de opiniões políticas da França de então.

Essa história deveria ser um aprendizado para todos os movimentos políticos onde se veem excluídos dos processos de tomada de decisão de forma as suas vozes não serem escutadas, como também um processo de aprendizados pelas elites as quais não percebem a construção da democracia pressupõe, serem tolerantes com as divergências que são parte de uma sociedade com diferenças sociais, geracionais e de gênero, ou seja a política é um fenômeno cultural pois expressa o que de fato são as sociedades como ela é gerida.

A ideia do lema francês também tem características de um pensamento cristão como uma trilogia de um pensamento unificar do espírito revolucionário O lema foi minimizado no período da ocupação nazista com trabalho, família e pátria para que não ocorresse um uso subversivo de Liberdade Igualdade e Fraternidade.

O esse espirito passou a ser a base das democracias liberais tendo esses conceitos inspiradores de vários processos políticos dentro da Europa, e fora dela como a Revolução Haitiana, a independência Americana. 


Quando das comemorações dos 200 anos da Revolução Francesa perguntaram a um ministro da China o qual a influência da revolução até aquele momento, ele respondeu é um evento muito recente para avaliarmos. 

A abrangência de Liberdade Igualdade e Fraternidade como fenômeno político e cultural no sentido de valores a serem incorporados no cotidiano constituidores do conceito de cidadão, essa também é a base da revolução francesa o sentido de cidadania e o chamamento de cada indivíduo de cidadão, ou seja aquele pleno de direitos, e direitos universais.

Os franceses levaram o lema da revolução a torna-lo reconhecido como patrimônio nacional, esse lema também se traduz nas cores que compõe a bandeira francesa onde a liberdade é azul, a igualdade branca, e a fraternidade vermelha, essa interpretação das cores pode vista de várias formas. 

Essa simbologia a e as influencias nas várias expressões políticas, artísticas e intelectuais, desde a tradução de Eugène Delacroix, em seu quadro a “Liberdade Guiando o Povo” ou na obra de Vitor Hugo “Os Miseráveis” e mais contemporaneamente no cinema uma dezena de produções, a exemplo da Trilogia das Cores do cineasta polonês Krzysztof Kieslowski, durante as comemorações dos 200 anos da revolução francesa.

Por essas questões os processos inspirados pela trilogia conceitual francesa reforçam uma leitura contemporânea, de um humanismo globalizado, as diferenças de classe, as identidades, e as diferenças culturas as alteridades e um olhar sobre os outros, como maneiras de pensar a vida social, e as artes acabam por ser a representação do momento que vivem as sociedades.

Como Karl Marx afirma no 18 Brumário de Luís Bonaparte:    

“(...) que todos os grandes fatos e todos os grandes personagens da história mundial são encenados, por assim dizer, duas vezes. Ele se esqueceu de acrescentar: a primeira como tragédia e a segunda como farsa. (...)Os homens fazem sua própria história; contudo, não fazem de livre espontânea vontade, pois não são eles quem escolhem as circunstancias”.  Sob as quais ela é feita, mas estas lhe foram transmitidas assim como se encontraram A tradição de todas as gerações passadas é como um pesadelo que comprime o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem estar empenhados em transformar a si mesmos e as coisas, em criar algo nunca visto, exatamente nessas épocas de crise revolucionaria, eles conjuram temerosamente a ajuda do passado, tomam emprestados os seus os seus nomes, as suas palavras de ordem, o seu figurino, a fim de representar, com essa roupagem tradicional e essa linguagem tomada de empréstimo, as novas cenas da história mundial”.

A retomada dessa reflexão para que possamos nesse momento que estamos comemorando os 230 anos da revolução francesa, seus legados sua influencias, podemos parar para atualizar os significados da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, para além do iluminismo francês. Mas sim para recuperar os sentidos iniciais que influenciaram tanto gerações de democracias, onde estruturam a simbologias desses movimentos de intelectuais mas sobretudo dos movimentos que forma construtores desses conceitos. 

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que também comemoramos 230 anos nesse ano, em seus primeiros artigos afirma o seguinte:

Art.1.º Os Homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum;

Art. 2.º A finalidade de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do Homem. Esses direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão;

Art. 3.º O princípio de toda a soberania reside, essencialmente, na nação. Nenhum corpo, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane expressamente;

Art. 4.º A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei; 

Mostrando sua contemporaneidade questões que foram fundamentais para influenciar A Declaração Universal dos Diretos Humanos, que em seu artigo primeiro diz: “Os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e de consciência e devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade“

Esse documento é pactuado pela maioria dos países que fazem parte da ONU, mesmo alguns desses conceitos sendo perigosamente relativizados em alguns desses países. Apontam que construção cultural desses conceitos passam por uma complexidade para além dos documentos oficiais.

Esse relativismo que uma declaração não obriga que os países ao aderirem estejam vinculados a cumprir tem apresentado distorções muito perigosas no cenário internacional que estamos vivenciando. Por isso que devemos te como um mantra das relações políticas e sociais essa tríade, da revolução francesa.

Liberdade, como possibilidade de concretização dos pensamentos levado ao limite do outro, não sendo escravo de outro ou se circunstancias sociais que o limitem, 

Igualdade, na diversidade respeitando a construção dos indivíduos e grupos sociais de seus processos e circunstancias de afirmação de suas condições, ideológicas de crenças e suas origens socioeconômica, e de gênero.

Fraternidade, nos coloca como seres que vivem em sociedade em constância reflexão crítica sobre as nossas relações sociais.

No caso brasileiro é um permanente aprendizado cada um desses termos merece uma revolução, pois são valores fundamentais da construção das relações sociais, que podem estruturar esses temas,  para aqueles que ainda se iludem que com processos de adesão a projetos sociais das elites achado que podem colaborar com os mesmos sem de fato existir um novo pacto de valores, como afirma Paulo Freire: "Os opressores, falsamente generosos, têm necessidade, para que a sua "generosidade" continue tendo oportunidade de realizar-se, da permanência da injustiça." 

Nessa direção, Liberdade, Igualdade e Fraternidade sempre estarão presentes como ideias estruturantes se estabelecendo como referências para além de seu tempo. O Brumário que fazia parte do calendário revolucionário é o período de Outubro no hemisfério, norte é o tempo do início do Outono das brumas das nevoas as quais devemos estar atentos, e no Hemisfério Sul é o período da Primavera, onde o florescer das cores, das ideias, da poética social onde inspiram a diversidade, pensamentos, onde a ocupação dos espaços públicos ficam mais chamativos, esse período tem esse apelo ao renascimento de energias para as renovações. 

Temos muitas coisas para comemorar desses 230 anos!
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José do Nascimento Junior é Cientista Social Antropólogo, Doutorando em Museologia e Patrimônio.

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