"O caminho da reconstrução da democracia no Brasil passa por derrotar a Lava Jato", por Luis Felipe Miguel

Publicado originalmente em seu perfil no Facebook.


A Operação Lava Jato é um dos episódios mais sórdidos da vida brasileira. É triste ver que ainda há, à esquerda, quem julgue que precisa defendê-la, seja por oportunismo (é preciso nadar a favor da correnteza), seja por uma ingenuidade quase inacreditável (os capitalistas estariam sendo pegos).

Na verdade, nem é preciso ser propriamente de esquerda. Qualquer liberal autêntico deve execrar a Lava Jato. Ela se constitui num verdadeiro mostruário de violações aos direitos individuais e ao império da lei. Melhor ainda: nem precisa ser liberal, basta um pouco de bom senso. 

É razoável que os papéis de perseguidor e juiz sejam exercidos pela mesma pessoa? É razoável que réus de processos similares recebam tratamentos tão díspares? É razoável que as penalidades aplicadas àqueles considerados culpados sejam modificadas conforme seus depoimentos implicam fulano ou beltrano? É razoável que um tribunal superior afirme expressamente que um juiz não precisa cumprir a lei? É razoável que esse juiz cometa ilegalidades de forma deliberada, com o objetivo de prejudicar aqueles que persegue? É razoável que ele confraternize com alguns de seus réus, ao mesmo tempo em que se engalfinha publicamente com outros? É razoável que oitivas e julgamentos sejam verdadeiras produções conjuntas entre Poder Judiciário e mídia corporativa?

Trata-se de uma operação de caráter político, que foi pensada e executada com o objetivo de alcançar determinados objetivos: a não-reeleição e, depois, derrubada da presidente Dilma Rousseff; a aniquilação do PT e da esquerda; o linchamento moral do ex-presidente Lula. No processo, fazem-se vítimas colaterais: um ou outro capitalista, políticos de direita alvejados pelas disputas internas da coalizão regressista ou imolados à opinião pública. Mas o objetivo central continua o mesmo.

A perseguição contra o ex-presidente Lula é o elemento mais grotesco. Contrariamente ao preceito de que a investigação nasce de suspeitas, mobilizou-se polícia, judiciário e ministério público para vasculhar sua vida em busca de algo que o comprometesse. É uma condenação em busca de um crime.

O caráter inquisitório da Lava Jato faz com que pensemos no juiz Sérgio Moro como um Torquemada das Araucárias. Mas Torquemada, até onde se sabe, era um fanático. Moro não tem essa desculpa. É um juiz de poucas luzes, que, a despeito de sua incontrolável vaidade, se dispõe a ser o joguete de interesses muito mais poderosos do que ele. Um símbolo, infelizmente, das elites do Brasil, em que sobra marketing e falta estofo, em que sobra oportunismo e falta caráter, em que sobra empáfia e falta qualquer tipo de empatia pelo povo brasileiro.

Não tem meio termo, não tem concessão ao discurso dominante e aos consensos fabricados pela mídia: o caminho da reconstrução da democracia no Brasil passa por derrotar a Lava Jato.


Luis Felipe Miguel é professor de Ciência Política da UNB.

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