O “novo" na política e a realidade eleitoral, por André Araújo

Publicado no Jornal GGN.


Nos processos de desagregação do sistema político de um País, janelas se abrem para todo tipo de aventuras, o assim chamado “NOVO”. No rescaldo da Grande Guerra de 1914, nasceu na Itália o ‘NOVO”, Benito Mussolini, um socialista que inventou o FASCISMO. Era o NOVO em relação ao velho, a grande coalização de poder que vinha do Risorgimento, o reagrupamento do Estado Italiano que estava por séculos fragmentado entre o Papado, o Reino do Piemonte, os ducados austríacos da Lombardia, Veneto, Trentino e Toscana e o Reino de Nápoles e Duas Sicílias.

O modelo que foi da formação do Reino de Itália nos anos 70 do Século XIX desembocou no pós-Grande Guerra com Primeiros Ministros tradicionais, como Giovanni Giolitti, Ivanoe Bonomi e Luigi Facta, homens solenes que faziam a política tradicional. Mussolini foi o NOVO que acabou em desastre em 1945, curiosamente Bonomi, o penúltimo Primeiro Ministro antes de Mussolini voltou a ser Primeiro Ministro depois de Mussolini, atravessando 23 anos da aventura fascista, mostrando que o velho também pode suceder o NOVO. A História tem idas e voltas, nunca é linear, tampouco lógica. A História é um jogo de variáveis imprevisíveis.

No rescaldo da mesma Grande Guerra surge na Alemanha uma República de Weimar, caótica, que derrapa e então chega o NOVO na pessoa de Adolf Hitler e o Nacional Socialismo.

Tanto Mussolini como Hitler eram “outsiders” em relação à velha política com raízes nos partidos tradicionais, no geral um quadro onde existia um partido de centro, um partido socialista e um pequeno partido de direita. Na Alemanha mais uma força considerável, o Partido Comunista, afinal o comunismo como ideologia nasceu pelo cérebro de um alemão.

Há dois tipos de NOVO: um de fora do Sistema e outro de dentro do Sistema.

O NOVO de fora não tem raízes no sistema anterior, é um novo completo. Já o NOVO de dentro do sistema é um candidato que não representa a força antiga, é uma RENOVAÇÃO que vem da política anterior em um processo evolutivo. Esse NOVO, mas com raiz na tradição, é o que costuma dar certo na evolução da política de um País. Caso clássico foi GETÚLIO VARGAS, um renovador da política brasileira MAS com origem na política tradicional. Getúlio tinha sido Ministro da Fazenda do Presidente Washington Luís e depois governador do Rio Grande do Sul, portanto um sólido político da situação tradicional. VARGAS foi uma evolução da Primeira República e não o NOVO aventureiro que vem por fora, veio de dentro.

Da mesma forma FRANKLIN ROOSEVELT, um renovador mas que tinha um pé na política tradicional como Subsecretário da Marinha no governo de Woodrow Wilson durante a Grande Guerra de 1914 e depois governador do Estado de Nova York. Roosevelt chegou à Presidência dos EUA por causa da Crise de 1929, ele propunha enfrentar a Depressão pela intervenção do Estado, acreditava que a crise não se resolveria pelo mercado, como pensavam os Republicanos que estavam no Governo, especialmente o Presidente Herbert Hoover, que perdeu a reeleição para Roosevelt, uma derrota pouco comum nos EUA, graças a uma ideia que era então revolucionária, nenhum Presidente americano tinha sido antes intervencionista em economia, isso não era parte do modelo americano, todo ele baseado na livre iniciativa. Roosevelt foi um revolucionário na economia e na abordagem da crise.

Ninguém mais NOVO  e antigo em 1940 do que Winston Churchill,  veio do establishment, filho de um lorde, descendente do Duque de Marlborough, nascido com pedigree, mas não era um político tradicional, instável, uma usina de ideias novas, desacreditado por mais de uma década, considerado carta fora do baralho, era um NOVO – velho, NOVO por sua visão e VELHO por sua experiência, tornou-se o homem certo na hora certa em 1940, mas em 1938 era um pária político desprezado por todos os partidos, já era considerado um inconfiável  porque trocou de partido mais de uma vez, algo raro na política britânica.

Tanto Roosevelt como Churchill, assim como Vargas, não eram paladinos da moral.

Roosevelt para ser eleito fazia acordos com as corruptíssimas máquinas eleitorais Democratas de Chicago e Missouri. Na sua última eleição aceitou um vice, Harry Truman, vendedor de camisas, indicado pelo chefão do Missouri, de péssima reputação, Tom Prendergast, dinheiro entrou na jogada. Na década de 30 a política americana era ultra corrupta.

Churchill sempre teve vida financeira atrapalhada, era um conhecido “facadista”, não tinha fonte de renda estável, recorria a seus amigos ricos judeus e pagou o favor pelo apoio incondicional à criação do Estado de Israel.

Políticos em geral NÃO podem ser julgados pelos padrões de pessoas comuns, não há político santo, a profissão é aética por natureza. Desde o tempo de Poncio Pilatos há necessidade de acordos, conchavos, parcerias de ocasião em diversos graus e escalas. Limites são necessários, mas serão tolos ou ingênuos os que esperarem por políticos moralistas como salvadores, podem ser os piores porque usam a moral como ferramenta para chegar ao poder. Os grandes estadistas da Era Moderna, Napoleão, Talleyrand, Bismarck, Gladstone, Salisbury, Clemanceau, Lloyd George, Briand, Stalin, Tito, Mao, não tinham escrúpulos, moral, ética, eram guiados pelas necessidades de Estado por ele interpretadas e podiam fazer pactos com o Diabo em pessoa se isso atendesse seus objetivos. Político padrão de honestidade só em fabulas.

NOVOS absolutos são um enorme risco para um grande Pais, uma ROLETA RUSSA, pode até dar certo mas o risco de dar errado é maior e INACEITÁVEL para um grande Estado.

O NOVO AVENTUREIRO, aquele que só existe porque há um vácuo na política tradicional é um extraordinário perigo em um regime presidencialista. Não foi testado, não exerceu poder antes, não se conhece bem sua personalidade, suas intenções, seu preparo, sua estabilidade emocional, seus vícios, suas fraquezas, suas companhias, seu caráter, sua firmeza. Como entregar um grande Pais e um Estado complexo a tal incógnita, a tal desconhecido?

É raríssimo na História moderna um NOVO puro dar certo. Para exercer o imenso poder de um Chefe de Estado é preciso décadas de experiência, de conhecimento, de conexões. Não se improvisa um Chefe de Estado nos grandes países. É mais do que um absurdo, uma loucura se entregar o poder imenso de um comando nacional a um personagem obscuro, improvisado,  nebuloso, escondido pelos biombos de uma vida até então privada, figura DESCONHECIDA ENQUANTO PODER. Pode ser conhecido em outra situação, como celebridade, empresário, artista, pastor, mas PODER é algo muito mais raro e difícil de exercer. E só se sabe como o personagem atua quando já está no poder, não antes, aí será tarde, o custo de desfazer o erro será sempre incalculável, limpar o malfeito pode durar anos.

Um País não tem o direito de entregar seu comando a um aventureiro para ver se dá certo. É risco demasiado, mesmo em circunstâncias normais, em épocas de crise o risco é ainda maior, as condições para errar são multiplicadas pela inexperiência, pelas desconexões. Atividade política é MUITO diferente de quaisquer outra, exige múltiplas qualidades simultâneas, uma certa frieza emocional e elemento central, foi a grade qualidade de Churchill na guerra, nada o abalava, nem os bombardeios de Londres sobre sua cabeça, nem os desastres sofridos pela Inglaterra no período de setembro de 1939 a dezembro de 1941, quando estava sozinha na luta contra o Terceiro Reich. Roosevelt também tinha essa força extraordinária, enfrentou inimigos internos que não lhe davam trégua, a começar da Suprema Corte que várias vezes o ameaçou, além de tudo era paralitico, mas sua força superava o conjunto imenso de problemas e desafios. Encontrou-se pessoalmente com Stalin em Teheran e Yalta, depois de viagens exaustivas antes dos jatos, nada abalava sem bom humor.

Esses grandes homens que vieram de dentro da política, eram POLÍTICOS PROFISSIONAIS, a classe que irresponsavelmente faz cruzadas moralistas e os politicamente corretos, querem desacreditar, sob o pretexto da corrupção, abrindo espaço para o aventureiro.

Se a corrupção custa caro, um desastre no Poder pode custar MIL vezes mais.


Andre Araujo é Advogado formado pelo Mackenzie, dirigente sindical patronal por 16 anos como diretor tesoureiro do Sindicato Nac. da Indústria Eletroeletrônica-SINAEES e da ABINEE-Assoc. Bras. da Ind. Eletroeletrônica, presidente da EMPLASA - estatal do Estado de São Paulo, diretor financeiro da PRODAM - estatal da Prefeitura de S.Paulo, membro do Conselho de Administração da CEMIG-Cia. Energética de Minas Gerais.

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