A crise e a classe média, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Publicado no Jornal GGN.


Irritada em razão de apoiar candidatos que foram derrotados pelo PT, a classe média foi às ruas e conseguiu derrubar Dilma Rousseff. O governo do usurpador, porém, não foi capaz de administrar a crise de identidade e consciência dos inimigos da democracia. De fato ninguém jamais conseguirá fazer isto.

Os membros da classe média brasileira sonegam impostos e exigem serviços públicos de primeiro mundo. Curiosamente, eles pagam escolas e planos de saúde. Portanto, eles não pretendem desfrutar os serviços públicos dos quais reclamam.

Isto também se aplica ao transporte público. A classe média reclama do transito, mas cada qual quer colocar seu carro na rua para não ter que compartilhar espaço com os mais pobres nos onibus, trens e metros. Quando ficam parados no congestionamento que criaram, os motoristas de classe média culpam a prefeitura e não a si mesmos.

O preço da gasolina subiu muito após o golpe de 2016. Mas a classe média parece satisfeita. O que era um problema insuportável durante os governos do PT passou a ser um leve incomodo sob o usurpador, pois apenas os mais pobres sofrem em consequencia do aumento do combustível. À medida que eles passam a deixar seus carros em casa, o transito diminuirá – imaginam os motoristas de classe média.

A lógica da classe média é infalível. Onde quer que os pobres ocupem espaço eles são um incomodo. Eles não devem ir ao Shopping, não podem usar seus carros nas ruas e, sobretudo, deveriam ser proibido de estudar nas universidades públicas. Viajar de avião, nem pensar. Homens e mulheres de classe média se distinguem pelo consumo e odeiam ser equiparados aos “outros”, razão pela qual eles devem perder a capacidade de consumir.

O usurpador nada fez para melhorar o desempenho da economia. A taxa de desemprego continua elevada, o comércio está morrendo e a arrecadação tributária caiu assustadoramente. O agravamento da crise não preocupa a classe média. Muito pelo contrário, o desastre programado do Brasil soa como uma solução nos ouvidos dos membros da classe média. Alguns deles, porém, já começaram a amargar os prejuízos. “Meu negócio vai de mal a pior, mas pelo menos tiramos o PT!” – consolam-se os empreendedores de classe média.

A redução de direitos trabalhistas, previdenciários e sociais vai afetar de maneira negativa a economia brasileira como um todo. Mas a classe média acredita que está acima da sociedade ou fora dela. Quando começarem a pagar a conta, que será cobrada de diversas formas perversas (estagnação econômica duradoura, depreciação do valor de mercado de imóveis e negócios, violência criminosa e política, etc...), homens e mulheres de classe média irão procurar consolo na igreja. Como Dorian Gray, eles não suportam ver as verdadeiras imagens.

“Nós defendemos a meritocracia”- urram os membros da classe média. Todavia, eles odeiam pobres, negros e nordestinos (não necessariamente nesta ordem), especialmente quando eles demonstram ter mérito para entrar numa universidade pública. “Privatizem tudo, inclusive as universidades...” eles gritam na internet e complementam apenas entre seus iguais “...antes que os filhos dos “outros” disputem espaços sociais e econômicos com os nossos próprios filhos.”

Homens e mulheres de classe média choram ao ver filmes norte-americanos que exploram situações exemplares de superação de desumanidades e injustiças. Ao voltar para casa, eles fecham os vidros dos seus carros e fazem de conta que são cegos para não ver as injustiças de uma sociedade que de maneira programática condena velhos, desempregados e crianças abandonadas a pedir esmolas nos faróis de transito.

“Tome uma moeda” - diz uma moça de classe média generosa. “Vai trabalhar vagabundo” - grita um juiz exasperado. Ambos acabaram de gastar milhares de reais num Petshop para embelezar seus gatos e cachorros, mas acreditam que o Estado não deve gastar algumas dezenas de reais para cuidar dos desvalidos. “Não pagaremos esta conta”, dizem inclusive aqueles que gostam de ser vistos agindo de maneira supostamente generosa.

É preciso parar de acreditar que a classe média vai colaborar para a solução da crise. A classe média é a crise. Ela vive uma crise insolúvel e que tende a piorar sempre que damos ouvidos às insanidades manifestas e desejos reprimidos dos homens e mulheres medianos (para não dizer medíocres). O melhor que a esquerda pode fazer é esquecer a classe média ou meter o pé na bunda dela.

Um comentário:

  1. A classe média quer ser da elite, mas nesse seletissimo grupo tambem nao há espaço para ela, eis o seu drama.

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