Lula, Pimentel e o exemplo de JK, por Durval Ângelo

Publicado no Jornal GGN.


“A história se repete. A primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”. Nunca a célebre frase de Marx me pareceu tão atual. Não sem motivos, o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, na solenidade de entrega da tradicional Medalha JK, no último dia 12, em Diamantina, lembrou em seu discurso a perseguição sofrida por Juscelino Kubitschek, após o golpe de 64, que o levou a três anos de exílio. Acusavam-no – pasmem! – de ser “o mais corrupto presidente que esse país já conheceu” e execravam-no nas manchetes de rádio, jornal e TV.

Hoje, poucos se lembram, ou têm conhecimento do alegado objeto da corrupção. Um apartamento na Avenida Vieira Souto, no Rio de Janeiro, que segundo os militares e a imprensa legitimadora do golpe, o ex-presidente teria recebido de um empreiteiro amigo. Nada se provou contra JK, é claro, pois o imóvel nunca pertencera a ele - e assim ocorreu em vários outros Inquéritos Policiais Militares que sofreu. Mas isso pouco importava, pois o objetivo do regime militar nunca fora o combate à corrupção, visto ser aquele um dos governos mais corruptos de nossa história.

O que pretendiam era impedir Juscelino de disputar as próximas eleições presidenciais. Sua imensa popularidade e liderança após um governo que transformara o país, era o principal obstáculo à continuidade do golpe, que precisava ser removido a qualquer preço. Qualquer semelhança com o que assistimos hoje no Brasil não é mera coincidência. A história se repete, muitas vezes, propositalmente, e de novo, como tragédia e farsa.

Sabemos o que a ditadura representou: supressão dos direitos e liberdades individuais, institucionalização de prisões ilegais, de crimes de tortura e assassinato e ampliação do abismo social. Uma verdadeira tragédia que o tempo se encarregou de revelar, assim como as farsas, calúnias e injustiças empreendidas contra aqueles que ousaram questionar os interesses dominantes.

Hoje, vivemos de novo a tragédia do golpe e a farsa de acusações sem provas a um ex-presidente com amplo apoio popular. Nem mesmo o pretexto mudou: um apartamento, supostamente recebido de uma construtora. A farsa tem muitos tentáculos. Em Minas, aqueles que se achavam donos do Estado - mas foram fragorosamente rejeitados pela população - tentam, a todo custo, inviabilizar o governo democrático popular de Fernando Pimentel. Para tanto, lançam mão de calúnias, denúncias infundadas, investigações e processos eivados de irregularidades.

As semelhanças não param por aí. Conforme apontou o governador em Diamantina, fatores externos e econômicos – leia-se, os interesses dos EUA - também motivaram a perseguição a JK. Afinal, em 1959, a fim de colocar o país, de vez, na rota do desenvolvimento, ele foi o primeiro presidente brasileiro a romper com o Fundo Monetário Internacional, tirando o Brasil da posição de submissão aos interesses americanos para afirmar a soberania nacional.

“Sabia e sei os riscos a que me tenho exposto: riscos exteriores, riscos de interesses criados dentro o Brasil, riscos de enfrentar as naturezas negativas, dos que preferem continuarmos indefinidamente adormecidos, pobres, mergulhados em dificuldades, sujeitos a toda sorte de surpresas. Bem sabia que a disposição de tentar recuperar o tempo perdido para o nosso país, que a experiência do desenvolvimento, seria considerada loucura, não pelo povo, que me acompanha, ampara e defende, mas pelo grupo pequeno e aguerrido dos que têm como programa destruir ou, no pior dos casos, não deixar construir coisa alguma”, afirmou Juscelino à época, como recordou Pimentel.

Foi imbuído do mesmo sentimento, que em 2005, Lula quitou a dívida brasileira com o FMI, livrando o país das imposições do Fundo, para o qual o Brasil viria a emprestar dinheiro em 2009. O mesmo projeto de desenvolvimento aliado à justiça social tem motivado o Governo Pimentel a adotar uma posição de independência em Minas. Ele levou o governador a se recusar a acatar as exigências restritivas do Governo Temer para conceder ajuda federal aos Estados, neste momento de profunda crise econômica. Não aceitou sacrificar o povo e o patrimônio mineiros e provou estar certo, pois apesar da grande dificuldade financeira, Minas é um dos poucos estados brasileiros que vêm alcançando o equilíbrio.

Mais do que isso, Pimentel tem liderado um movimento nacional de governadores em busca do “encontro de contas com a União”, a fim de que os Estados recebam a compensação das perdas bilionárias com a Lei Kandir, que desde 1996, isentou exportações do pagamento do ICMS. Reunidos em Diamantina na última segunda-feira, os governadores lançaram um manifesto, no qual também denunciam a fragilidade atual do pacto federativo, com a queda vertiginosa da transferência de recursos para Estados e Municípios.

Nada mais buscam que não a justiça, e que seja feita sem o confronto, mas por meio do “diálogo institucional”, como se espera de estadistas de fato. Afinal, como bem afirmou Fernando Pimentel, “a história não é escrita pelo ódio e pela intolerância, nem tampouco pelas canetas da intriga e da notícia irresponsável. É o amor do povo àqueles que se dedicaram ao Brasil e às causas populares que conserva impolutas na memória figuras como a de Juscelino Kubitschek. Os aplausos aos inquisidores, mesmo que ruidosos, se provocados pela infâmia e pela calúnia, são efêmeros e não ecoam na história”.


Durval Angelo é professor e está Deputado estadual (PT-MG) e líder do governo na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

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