"Flexibilidade entre dois pólos para se buscar um projeto nacional", por José Carlos de Assis


O impeachment foi um golpe. Não há muito que conversar a respeito. O problema agora é saber o que a sociedade brasileira vai fazer depois do impeachment. Se não houver nenhuma solução de compromisso pela qual uma parte da sociedade que torceu pelo impeachment não reconsiderar sua avaliação, buscando uma alternativa política para uma crise que veio antes e se aprofundou depois do impeachment, não haverá solução para os problemas nacionais e sociais, o principal deles derivado diretamente do Governo Temer.

Entretanto, não vejo como se possa estabelecer um compromisso com parte da sociedade que foi favorável ao impeachment se a parte que foi contra se mantiver numa posição rígida de denúncia dos chamados golpistas, desconhecendo sua posição obviamente minoritária. Desse ponto de vista, é contraproducente dizer se houve um golpe ou não. O importante é procurar saber o que se deve fazer à frente. A sociedade está à espera de uma proposta concreta para o encaminhamento de um destino nacional. O resto é retórica vazia.

Vejamos concretamente os processos políticos que provavelmente se desdobrarão à frente. Tenho diletos amigos entre os progressista segundo os quais o problema se resolverá com a eleição de Lula em 2018. Essa hipótese não considera fatores como a saúde de Lula, a vontade de Lula, a situação judicial de Lula, a governabilidade de um futuro novo presidente Lula. Tudo se reduz ao Lula, salvador da Pátria. O argumento forte para isso são as pesquisas de opinião. Se a eleição fosse hoje, Lula teria 40% dos votos, etc, etc.

O problema com essa premissa, além dos fatores indicados acima, é que, tendo alta probabilidade de se eleger, Lula dificilmente elegeria junto com ele uma maioria no Congresso. Dirão que Lula, diferente de Dilma, tem uma tremenda habilidade de negociação e cooptaria os parlamentares. O que isso significa? Usaria os cargos de ministro, de presidentes e diretores de estatais para formar, através deles, uma maioria parlamentar? Ou, mais objetivamente, compraria uma base? Não seria isso um novo patamar da Lava Jato?

Entendo que a solução “Lula salvador da pátria” é um atalho falso para algo muito mais desafiador, a saber, como as partes acima referidas da sociedade brasileira, combinando de alguma forma os segmentos pró e contra impeachment, influirão de forma decisiva na formação do novo Congresso de 2018. Se alguma coisa nesse sentido não for feita cairemos na mesma situação ultrajante em que nos encontramos, na qual cerca de dois terços da Câmara e do Senado estão virtualmente comprados e pagos pelo Governo Temer.

Escrevi dias atrás sobre uma reunião de que participei com os Midia Ninja na qual me impressionou o alto grau de maturidade dos garotos. O que disse acima reflete um pouco disso. Eles querem convencer os “coxinhas” de suas razões porque acham que muitos “coxinhas” se deixaram enganar pela retórica do impeachment. Também não há como ampliar seu movimento a não ser ouvindo a opinião do outro, que em muitos casos reflete uma convicção sincera de que o impeachment era justo. Convenci-me que a intolerância pública absoluta é um problema de minha geração. Os jovens estão noutra, bem mais flexíveis.

Temos que nos preparar não para uma eleição de presidente da República, mas para uma eleição do Congresso Nacional. Sinto que os jovens tem uma consciência disso. Entretanto, devo advertir para um problema mais imediato: por algum caminho, seja o caminho das denúncias, seja o caminho da renúncia, Michel Temer pode cair. Temos que nos preparar para uma eleição indireta, sem Lula. A professora Beatriz Vargas me mostrou argumentos jurídicos relevantes de que, se Temer sair agora, a saída constitucional são eleições diretas. Em qualquer hipótese, os nacionalistas progressistas tem que estar preparados. 

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