Para entender a força de Bolsonaro, por Esther Solano
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Falta muito exercício de humildade para entender a força de Bolsonaro. Para entender que ele é um grito. As pessoas estão gritando. Sim, tem monstros que apoiam ele, tem racismo, misoginia, homofobia, sim,mas, a maioria não são monstros e devem ser escutados. Aliás, eu acho que inclusive os monstros devem ser escutados porque muitas vezes é nosso sistema que produz eles:
1) As pessoas que entrevistei sempre falavam direta ou indiretamente do que eu denomino "medo existencial", ou sejam incapacidade cognitiva, emocional de entender as mudanças aceleradas e a fluidez deste mundo. Elas tinham medo do futuro e não esperança. Elas querem a volta da hierarquia, da autoridade, do mundo ordenado e "arrumado" do passado. Se você consegue se sentir a vontade neste mundo vertiginoso e hipercomplexo, talvez é porque você tem o privilégio de ter aceso a educação, conhecimento e informação. Não todos têm este privilégio.
2) Todas falaram com angústia da (in)segurança pública brasileira. 60.000 mortos por ano. Aguém acha loucura que as pessoas sem bom conhecimento política sintam-se tão desesperadas por estes números que queiram acreditar em qualquer solução possível? Qual é a solução eficaz que o campo progressista ofereceu para esses 60.000 mortos durante todos estes anos?
3) Todos falavam que a política brasileira é corrupta, personalista e que se sentiam abandonados pelos políticos. Difícil de entender quando nós sabemos que o estado brasileiro está altamente privatizado, refém do mercado, de uma máquina fisiológica asquerosa, de oligarquias, de elites?
4) Todos também compartilhavam o discurso da meritocracia, do cidadão-consumidor. Não é isto compreensível num mundo onde o ser humano é medido pelo que compra e produz, num país onde aqueles que não têm nada em termos materiais não têm nem direito à vida? Num mundo onde até Deus virou mercadoria?
Bolsonaro é tudo isso. No seu desespero, as pessoas falam como podem, como sabem. Há muito tempo que as pessoas estão falando. Não estamos escutando.
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Esther Solano é socióloga da Unifesp.
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